Angola abre portas da “Bolsa de Valores” em Dezembro com emissões da dívida pública


A Bolsa da Dívida e Valores de Angola (BODIVA) vai abrir portas já na primeira quinzena deste mês de Dezembro, com primeiras emissões que vão ajudar o Estado a financiar os seus projectos a taxas mais atractivas.

BODIVA

As operações da Bolsa da Dívida e Valores de Angola (BODIVA) arrancam já na primeira quinzena do próximo mês de Dezembro, a iniciar com primeiras emissões do Estado, conforme garantiu o seu administrador, Pedro Pitta Groz.

De acordo com o responsável, as operações na BODIVA vão ser asseguradas, numa primeira fase, por um uma equipa composta por 20 técnicos, incluindo directores, dos quais 19 são profissionais de origem nacional.

O administrador da BODIVA também assegurou que, em termos regulamentares, estão em fase de conclusão as regras e os regulamentos indispensáveis ao arranque do segmento do mercado de dívida pública, esta que vai constar da primeira fase da operação da bolsa, ao passo que, na componente tecnológica, está igualmente em fase de conclusão a “parametrização” do módulo de negociação do Sistema Integrado dos Mercados Regulamentados (SIMER).

“(…) Numa primeira fase, as operações de pós-negociação manter-se-ão na plataforma tecnológica SIGMA, do Banco Nacional de Angola (BNA). Paralelamente, têm-se realizado encontros com os bancos, os futuros operadores do mercado, com vista à ligação destes aos nossos sistemas informáticos e de comunicação”, explicou Pedro Pitta Groz. A entrada em operacionalização da BODIVA é, no entanto, uma oportunidade de o Estado multiplicar a fonte de financiamento dos seus projectos, assim como de os empresários e as famílias investirem as suas poupanças.

De acordo com Manuel Alves da Rocha, professor e investigador da Universidade Católica de Angola, a variável determinante do funcionamento de uma bolsa de valores é a disponibilidade de poupança, exemplificando que, até ao ano de 2020, “o Estado apresentará uma poupança negativa”, ao passo que as famílias mais abastadas poderão ver na Bolsa uma boa oportunidade de as multiplicar os seus recursos. Também Hirondino Garcia, empresário do grupo Bafrikon, elogia a entrada em actividade da Bolsa de Angola.

Segundo o gestor, com a entrada em funcionamento da BODIVA, as empresas vão ter mais recursos para financiarem os seus projectos, e reforça que o Estado vai aumentar financiamento dos seus projectos. “Este instrumento vai permitir que as empresas passam a ter um valor real que se torna público, além de alavancar a própria economia do País”, disse o gestor da construtora angolana Bafrikon, que, ao mesmo tempo, apelava para preparação dos empresários para a recepção do novo ins-trumento de financiamento à economia.

Apesar dos benefícios que a Bolsa poderá trazer ao cenário empresarial angolano, não são serão as empresas as primeiras beneficiárias das oportunidades da BODIVA. De acordo com a Estratégia de Actuação da Comissão do Mercado de Capitais (CMC), órgão que superintende e coordena as acções para o arranque da BODIVA, o mercado de acções, que vai abranger as empresas, só entra em actividade em 2015, ou seja, a seguir à dívida pública. Para assegurar o bom funcionamento da Bolsa, o órgão dirigido por Archer Mangueira dividiu o processo de entrada em operacionalização da BODIVA em seis etapas, que correspondem aos mercados, nomeadamente a fase do Mercado de Dívida Pública, do Mercado de Dívida Corporativa, a fase do Segmento dos Fundos de Investimento, a fase do Mercado de Acções, além das fases dos Mercados de Futuros e dos Outros diplomas de suporte ao mercado.

A fase da dívida pública – esta que arranca já em Dezembro – é também considerada por fase da “Alavanca do investimento público e Projecção da curva de rendimentos”, segundo a CMC, e acontece quando o Estado pede dinheiro emprestado aos bancos, empresas, entre outros investidores, para financiar parte dos seus gastos que não são cobertos com a arrecadação de impostos.

Sobre a etapa do Mercado da dívida Pública e Títulos do Tesouro, Alves da Rocha disse que a negociação já existe há algum tempo, e explica que parte da actual dívida pública interna tem sido criada através da captação de poupanças privadas angolanas, das famílias e das empresas, um processo que, segundo o académico, tem como agentes o Banco Nacional de Angola (BNA) e os bancos comerciais. “A partir do momento em que se institucionalizar a BODIVA os actores passarão a ser este organismo, o público e os bancos comerciais, explica o professor, que considera a entrada em acção da BODIVA como um passo em direcção à organização duma economia de mercado”, além de ser uma modalidade de financiamento dos défices fiscais.

Apesar das vantagens avançadas sobre a entrada da BODIVA, Alves da Rocha explicou, por outro lado, que a entrada em operacionalização da BODIVA não é ainda geral, justificando que “apenas o Estado vai passar a dispor de um mecanismo institucionalizado para financiar a sua actividade no diferencial das suas receitas e despesas, caso seja negativo”.

BODIVA vai medir peso das empresas

Economistas e consultores empresariais consideram, no entanto, que é no mercado de capitais onde se conhece o valor das empresas. Para o engenheiro e consultor Galvão Branco, o mercado de capitais, com a Bolsa de Valores, “vai impactar positivamente na economia do País, sobretudo no seu elemento reactor, que é a actividade empresarial”.

Ainda assim, Galvão Branco acredita que a operacionalização do mercado de capitais vai igualmente permitir que os investidores tenham acesso a mais uma fonte de obtenção de capitais, em condições mais vantajosas que o tradicional crédito bancário. “Outra das vantagens será uma nova dinâmica que o mercado de bilhetes de dívida pública irá ter, sendo, contudo, a institucionalização da Bolsa de Valores que permitirá a constituição de empresas mais robustas e competitivas e com um valor económico mais legível pelo mercado”, explicou o consultor empresarial, que aponta as dificuldades de acesso aos créditos bancários e as condições em matéria de juros como aspectos que serão ultrapassados com a entrada em funcionamento da BODIVA.

O mesmo foi referido pelo economista Rui Malaquias, que considerou fundamental a entrada da Bolsa de Valores no cenário económico do Pais, por achar que o mesmo segmento pode ajudar no desenvolvimento económico de Angola, mas alertou para o perigo de Estado ser o único emitente nesta primeira fase da bolsa.

BODIVA1

“O facto de ser apenas uma bolsa de dívida levanta algumas questões de ordem operacional, porque pensamos que o Estado, na pele do Tesouro, é o actor principal deste ‘filme’, pois é ele que vai ser o responsável pela existência deste mercado”, disse o também professor universitário, que acredita que a bolsa vai fortalecer as empresas nacionais.

Rendimento vs. riscos

Para além das oportunidades oferecidas no ambiente bolsista, os investidores precisam de estar atentos aos riscos associados a esta prática, conforme explicou Alves da Rocha. O professor da UCAN dá exemplo da crise dos Estados Unidos da América, que, nos anos 1929, 1986 e 2009, estendeu os seus efeitos a todas as bolsas do mundo. “Nenhum destes potenciais investidores se pode esquecer do elevado risco associado aos investimentos bolsistas e ao carácter aleatório dos ganhos que por seu intermédio são propiciados”, alertou o professor, para quem a história americana deve servir de modelo.

Boa contabilidade e transparência de gestão

As empresas também foram alertadas para os riscos do negócio bolsista, sobretudo no que a contabilidade e gestão diz respeito. Na opinião de Alves da Rocha, o rigor, a transparência e o cumprimento das regras fundamentais do corporate governance e do corporate finance das contas das empresas são uma exigência e uma medida que deve ser adoptada para o bom funcionamento do mercado de capitais.

“A maior parte das Bolsas de Valores dos países da SADC, com destaque para a África do Sul, rege-se por estes paradigmas e, consequentemente, se outras Bolsas de Valores os garantirem, fica mais fácil e mais desejável a cooperação”, lembrou.

A opinião do consultor Galvão Branco vai no mesmo sentido. Segundo este analista, as empresas angolanas ainda não apresentam os requisitos que são exigidos para quem quer investir na bolsa, um facto que, na sua opinião, tem de ser tratado com cultura de prestação de contas e a disponibilização de informações credíveis. “Os investidores que actuam no mercado de capitais, aplicando os seus recursos, exigem que os activos colocados em Bolsa sejam suficientemente suportados em informação credível, e suficientemente ilustrativa de que se trata de uma aquisição proporcionadora de ganhos e vantagens para as partes envolvidas”, explica o também engenheiro, que elogia as instituições bancárias, seguros e telecomunicações em matéria de prestação de contas e boas práticas de governação.

Mas o administrador Pedro Pitta Groz garantiu estarem já em curso os processos de cooperação com outros mercados financeiros, como é o caso, por exemplo, da adesão a organizações como a Associação das Bolsas de África (ASEA) ou à Associação das Bolsas de Valores da SADC (COSSE). “Importa referir que a cooperação com as bolsas da região deriva de uma directiva da SADC, no âmbito da actuação do CISNA – Comité de Autoridades de Seguros, Fundos de Pensões e Instituições Financeiras não Bancárias da região”, disse.

Por:Expansao


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