O “Efunja”, é um sistema de informação que ajuda a prever cheias e inundações, com previsões de arrancar ainda este ano a fase piloto no município do Cazenga, em Luanda. Após ter vencido a categoria “Meio Ambiente”, nos “Prémios Tigra Nova Garra 2022”, a plataforma tecnológica idealizada pelo geólogo Marco Paulo Neves dos Santos Carlos, adquiriu uma vertente de intervenção comunitária, dando ao projecto um forte cariz social.
Dizem os mais velhos que “A necessidade aguça o engenho”, e o “Efunja” de Marco Paulo é um bom exemplo disso. O sistema de informação geográfica que o geólogo angolano criou em 2021, “depois de viver duas inundações fortes em Luanda”, compila dados geoespaciais e in situ, combinando-os com variáveis geológicas e ambientais para prever cheias e inundações em lugares vulneráreis.
O que começou como uma motivação pessoal acabou por se transformar num projecto com um enorme potencial, como constatou o profissional no sul de Angola, onde assistiu aos efeitos das secas extremas, alternadas com inundações repentinas. “No âmbito da sustentabilidade, equacionei, por exemplo, por que não usar os dados do projecto para aproveitar as águas dos períodos de cheias, armazená-las de forma mais eficiente do que se faz nas tradicionais chimpacas, e usá-las nos períodos de seca”, contou.
A ideia de Marco Paulo brilhou a nível internacional. Em 2021, o “Efunja” ganhou a medalha de prata na Feira Internacional de Ideias, Inovações e Novos Produtos em Nuremberga, Alemanha.
“Chamou-lhes a atenção o conceito, que previa uma aplicação de telemóvel com um sistema de alerta de inundações, dicas de segurança com base no GPS, como rotas de fuga, e o uso de várias línguas, entre as quais o kimbundu e cuanhama”, comentou.
No final de Maio deste ano, foi a vez de Angola reconhecer o talento de Marco Paulo, com a atribuição do Prémio Tigra Nova Garra 2.ª edição, na categoria do Meio Ambiente. Reconhecimento que o geólogo considera que “Foi um importante ponto de inflexão, que elevou o projecto a outro nível”, garantiu o jovem de 25 anos, que acrescentou, que “Nas sessões de mentoria que a Tigra proporciona aos vencedores, fizeram-me ver que, se queria resultados relevantes, teria que envolver as comunidades e transformar os conceitos técnicos e ‘chatos’ do ‘Efunja’ numa linguagem do dia-a-dia, para que todos pudessem entender a importância e utilidade da aplicação“.
“Demo-nos conta que a ideia inicial de uma plataforma tecnológica teria que evoluir para algo maior, uma organização não governamental que desenvolva campanhas de sensibilização sobre gestão de resíduos, que muitas vezes entopem as valas de drenagem, construção anárquica em zonas vulneráveis do ponto de vista hidrológico e outros temas relevantes”.
De acordo com Marco Paulo, o “Efunja” está actualmente em fase de reestruturação e a primeira etapa do programa vai avançar ainda este ano no Cazenga. Pois, considera que trata-se de uma “escolha com base científica” por ser uma zona que possui o que “chamamos de aquíferos suspensos, águas muito superficiais que brotam naturalmente do solo”. O geólogo adverte que se não houver barreiras que controlem esta questão, como os eucaliptos que ali se plantavam na época colonial, durante uma inundação os efeitos podem ser bastante graves.
Para mitigar alguma forma este risco, o “Efunja” quer identificar embaixadores comunitários e mobilizar a população do Cazenga a vários níveis, nas escolas, dando um carácter educativo ao programa, nos hospitais, porque as águas paradas propagam vírus e bactérias e junto da Protecção Civil e dos corpos de bombeiros.
A intervenção do “Efunja” no Cazenga será financiada com o valor monetário de um milhão de kwanzas que o geólogo ganhou na segunda edição dos Prémios Tigra Nova Garra.
Para Marco Paulo, projectos como o ‘Efunja’ demonstram a necessidade dos órgãos de tutela intervirem urgentemente em sectores críticos como o ordenamento do território. E Luanda, “é o exemplo perfeito de como os assentamentos urbanos desgovernados em áreas de descarga de aquíferos podem provocar calamidades.
“Se impermeabilizamos uma zona que naturalmente absorve a água das chuvas, não é difícil adivinhar o resultado”, disse.
Noutra vertente, o geólogo espera que a reflexão sobre temas críticos como este, envolvam cada vez mais a voz dos jovens angolanos. Pois, acredita que em Angola existe o tabu de que a juventude não faz nada, mas há muitas ideias de jovens, o que reflecte um esforço em encontrar soluções que poderão ser melhoradas com a contribuição de todos. Marco destacou: “Não queremos reconhecimento para ser famosos, mas sim para demonstrar que estamos aqui, prontos para ajudar a pensar como ser um melhor país e trabalhar sem descanso”.
Para finalizar o jovem garantiu que “os Prémios Tigra Nova Garra” são das poucas iniciativas em Angola que permitem aos jovens ter esse espaço de afirmação, ao mesmo tempo que nos dão uma visibilidade que vai muito além da nossa limitada bolha pessoal e social. Durante o processo de nomeação e mesmo depois da premiação, encontrei muita gente que luta todos os dias pelos seus projectos e que sacrifica tempo e recursos próprios, porque acredita que pode marcar a diferença”, sublinhou.
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