O diretor do Centro de Estudos e Investigação Científica (CEIC) defende que mais do que a introdução do euro ou do yuan chinês em Angola, como alternativa aos escassos dólares, é necessário priorizar, em definitivo, o acesso a divisas.
Para Alves da Rocha, economista do CEIC, instituição da Universidade Católica de Angola, a moeda estrangeira deve “deixar de circular em paralelo” com o kwanza, como acontece atualmente, mas agravada nos últimos meses com a desvalorização de mais 30 por cento na moeda nacional face ao dólar norte-americano, devido à crise cambial em Angola.
A escassez de dólares nos bancos angolanos – que está a comprometer importações e viagens ao estrangeiro de cidadãos angolanos – é explicada, além da crise do petróleo, também pelo corte no fornecimento de bancos norte-americanos, alegadamente por dúvidas sobre lavagem de dinheiro e financiamento ao terrorismo a partir dos movimentos de divisas por Angola.
Como alternativa, e numa altura em que um dólar norte-americano chega a custar 280 kwanzas nas ruas de Luanda – o dobro da taxa de câmbio oficial, mas praticamente incessível nos bancos devido à falta de divisas -, tem sido colocada a hipótese de recurso à moeda europeia (euro) ou à chinesa (renminbi ou yuan), para garantir divisas.
“A nossa confiança no kwanza será cada vez maior à medida que sentirmos que há possibilidade de cobrirmos as necessidades que temos de moeda externa, quer os agentes empresariais quer as famílias no geral. Não vejo que haja necessidade de ter aqui o dólar a circular em paralelo com o kwanza, ou o próprio euro e o yuan”, defendeu Alves da Rocha, em declarações à Lusa.
A venda de divisas (dólares) pelo Banco Nacional de Angola (BNA) aos bancos comerciais atingiu entre 2012 e 2014 máximo anuncias históricos, de respetivamente 1.516 milhões, 1.606 milhões e 1.597 milhões de dólares (entre 1.380 e 1.465 milhões de euros).
Esse montante, nos primeiros dez meses do ano, de acordo com dados recolhidos pela Lusa junto do BNA, já ascende a 1.516 milhões de dólares (acima de anos anteriores), pelo que a falta de divisas é influenciada essencialmente pela quebra abrupta – reduzida a cerca de 10% dos valores do ano anterior – da compra de divisas dos bancos aos clientes.
Entretanto, as Reservas Internacionais Líquidas (moeda estrangeira) angolanas renovaram em outubro valores mínimos de vários meses, fixando-se em 23.412 milhões de dólares (21,3 mil milhões de euros), e já caíram 13 por cento desde o início do ano, sendo ainda suficientes para garantir cerca de seis meses de necessidades de importação.
Os governos de Angola e da China estão a negociar desde junho um acordo monetário prevendo a aceitação recíproca das moedas dos dois países, o que poderia nomeadamente facilitar as importações angolanas.
Para Alves da Rocha, o processo de ‘desdolorização’ da economia angolana, que se acentuou no primeiro semestre de 2014, não deve ser travado devido à crise atual, mas é necessário uma “gestão correta e realista da situação” por parte do BNA, que gere o acesso à moeda estrangeira.
“Creio que não haverá necessidade de nós estarmos aqui a coexistir com o dólar, porque não é isso que se passa nos outros países, em que circula a moeda nacional e quando há necessidade de fazer transferências os bancos garantem-nas. Isso dá confiança a todos os agentes económicos para utilizar a moeda nacional”, defende o diretor do CEIC.
“O importante é que o sistema bancário, e dentro das limitações atuais, nos dê a garantia de que quando necessário, devidamente certificado para evitar fuga de capitais ou lavagem de dinheiro, temos acesso a essas divisas. Aí, não teremos necessidade nem do euro, do yuan ou do dólar”, rematou o economista.
AR/Lusa