Tristes, mas orgulhosos de Nelson Mandela, os sul-africanos prepararam-se para uma semana de exéquias, naquele que prevêem seja o mais concorrido funeral da história e um pesadelo logístico superior ao Mundial de Futebol que organizaram em 2010.
A morte de Madiba está em todo o lado: nos avisos eletrónicos das autoestradas, em cartazes publicitários pagos por bancos e grandes multinacionais, nas mãos dos ardinas, nas estações de rádio, que, praticamente, não passam música e nos obsessivos debates nas televisões.
E, é por isso desconcertante que o Hospital Militar de Pretória, onde se encontra o seu corpo seja um local sem pessoas nas suas imediações e moderadamente vigiado por polícias – um ramo de flores preso numa cerca de arame de um campo de golfe é tudo o que evoca a presença no estabelecimento do antigo presidente sul-africano.
“Não, aqui não vem ninguém“, confirma uma mulher-polícia que sugere que em Union Buildings (a sede do governo sul africano em Petória) poderão estar pessoas a homenagear Mandela.
Mas é no Soweto, em Joanesburgo, que finalmente, se veem homenagens públicas ao primeiro Presidente negro do país, junto da casa onde viveu, agora transformada em museu, diante da qual dezenas de jornalistas de todo o Mundo atrapalham os muitos que vão ali recordar o combatente.
“Já se esperava a morte de Nelson Mandela nas não deixou de ser um choque para nós. Não creio que haverá uma crise, Mandela sempre disse que era parte de um coletivo e, por isso, os valores que tinha continuarão a ser os valores do ANC”, disse à Lusa Peter Fisher.
O pastor na Igreja Oásis de Esperança está acompanhado da mulher e os dois sobem lentamente a rua Vilakasi, passando diante de um batalhão de fotógrafos e operadores de câmara, das repletas esplanadas dos restaurantes e das bancas ambulantes, que vendem camisas, bonés e capulanas com o retrato de Mandela, à mistura com bonecos japoneses e peças de artesanato.
Freesa Mogadi acabou de vender um chapéu com o retrato de Madiba a um japonês, por 120 rands (cerca de 8.50 euros) e admite que o negócio “está bom, melhor do que na semana passada” mas o porteiro da casa-museu de Mandela não vai pelo mesmo caminho e garante que o número de visitantes nos últimos dias não ultrapassou “os 250, 300 de sempre”.
A vender coisas que não têm nada a ver com o caso, o moçambicano Félix Pascoal, que chegou à África do Sul ainda no tempo do ‘apartheid’ e não esconde a admiração pelo antigo líder do país que adotou.
“Há 26 anos que estou aqui e mudou muita coisa. Mandela deu liberdade a outras pessoas e eu continuo a fazer dinheiro e a fazer qualquer coisa que quero na minha casa. Já tenho três filhos”, diz o vendedor, natural do bairro do Infulene, em Maputo.
No centro da rua, sucedem-se as danças e canções de grupos de militantes, vestidos com camisas da mesma cor e que descem a rua Vilakasi, seguidos pelos fotógrafos e pelos gravadores das estações de rádio.
A meio da manhã há um ambiente de festa moderada, de luto e também de esperança, resumiu Anna Balui, uma ativista do ANC: “É um dia triste mas também um dia em que podemos celebrar Madiba”.
Ao lado, um companheiro de partido, Kabila Mukangane, acrescenta uma fé inabalável na nação arco-íris idealizada por Mandela.
“Todos os nacionalistas devem unir-se: negros e brancos, castanhos, cremes e dourados, chineses, indianos e de cor, isto é o que queremos abraçar e levar para a frente”, diz.