Os salários dos angolanos registaram uma perda acumulada de 38,3 por cento do valor real entre 2010 e 2014, com a população a ter cada vez menos dinheiro disponível devido à inflação.
Os dados constam do relatório social anual (2014) do Centro de Estudos e Investigação Científica (CEIC) da Universidade Católica de Angola, hoje apresentado numa conferência internacional, em Luanda, apontando a análise a um salário mensal nominal de 25.000 kwanzas (190 euros).
Se em 2010 este salário correspondia, em termos reais, segundo o estudo, a 16.805 kwanzas (127 euros), esse valor, para o mesmo montante, atingiu no ano passado os 11.954 kwanzas (91 euros). Ou seja, uma perda acumulada do valor real do salário, em quatro anos, de 38,3%.
“A inflação corroeu bastante os salários. O salario nominal continua a subir, com aumentos calculados face à inflação esperada, que normalmente fica abaixo da inflação real. Mas além desta perda nominal, temos também uma perda real dos salários”, explicou à Lusa Nélson Pestana, coordenador do departamento de estudos sociais do CEIC e um dos autores do relatório.
O estudo refere que só em 2014 a perda anual do valor real atingiu os 7%, mas também admite que o “crescente controlo da inflação evitou uma quebra mais acentuada” dos salários em Angola.
Na análise de 2014, o docente da Universidade Católica de Angola refere que o quadro “continua mais ou menos o mesmo”, apesar de “algumas melhorias pontuais” e “sem correção das assimetrias”.
O vencimento médio angolano permanece à volta dos 45.000 kwanzas (340 euros) por mês, “sem levar em conta salários estratosféricos”, quando 60% da população sobrevive com dois dólares por dia.
“No geral não houve correção de assimetrias em 2014. Se compararmos com outros países é claro que é mau, muito mau. Porque o problema é que a tendência do discurso oficial é ser autista, olhar só para si. Dizer que estávamos muito mal quando tínhamos guerra civil [até 2002] e estamos muito melhor agora, não é sistema de avaliação”, criticou o investigador angolano.
Ainda assim, o estudo reconhece pontuais melhorias, como no acesso ao ensino primário, que em 2014 contou com 5.189.717 matrículas, um acréscimo de 26.838 face ao ano anterior, numa média anual de crescimento anual de 31,5% desde 2002.
“Continua a haver centenas de milhar de crianças fora do sistema de ensino, que muitas vezes são enquadradas nas chamadas escolas comunitárias, que no próximo ano vamos estudar com interesse particular. São as chamadas explicações, das Igrejas, das associações, que não contam para estes indicadores”, explicou Nélson Pestana.
A falta de acesso ao ensino, à assistência médico-sanitária, de apoio ao desenvolvimento familiar e das crianças, “mas sobretudo a política da baixa reprodução social, com baixos salários”, são problemas identificados no relatório social anual do CEIC.
AR/Lusa